A 4ª Câmara de Direito Civil confirmou sentença de
comarca do Sul do Estado e negou a divisão de imóvel de moradia postulada
por um homem que teve decretado o divórcio no ano de 2000. Ele ajuizou a
ação de sobrepartilha em 2008, já que foi revel na ação de divórcio,
ajuizada pela ex-esposa, de forma que não houve a partilha de bens naquela
ocasião. A mulher, em defesa, alegou que o imóvel não poderia ser dividido
com o ex-marido porque, embora registrado em condomínio entre eles, há
muito tem a posse exclusiva sobre o bem, tendo-o adquirido pela via do
usucapião.
O relator, desembargador Eládio Torret Rocha,
apontou não haver dúvidas de que o homem abandonou o lar, deixando os
bens, a esposa e os sete filhos do casal à sua própria sorte. Ele apontou,
ainda, que em casos de prolongado abandono do lar familiar por um dos
cônjuges a doutrina e a jurisprudência consolidaram o entendimento de que
é possível, para aquele que ficou na posse sobre o imóvel residencial,
adquirir-lhe a propriedade plena pela via da usucapião, mitigando-se,
excepcionalmente, a aplicação da norma que prevê a não fluência dos prazos
prescricionais nas relações entre cônjuges.
Salientou o relator que a posse exercida
exclusivamente pelo cônjuge separado de fato sobre o imóvel que serve de
residência à família, pode, excepcionalmente, dar ensejo à usucapião do
bem registrado em conjunto, dependendo das circunstâncias, desde que fique
demonstrado que essa posse unilateral é exercida em nome próprio e não por
convenção entre as partes ou imposição judicial, tampouco se qualificando
como mera tolerância do outro cônjuge enquanto pendente a partilha
definitiva dos bens.
Torret acrescentou que, se a posse exercida por um
dos cônjuges sobre o bem não decorre da união conjugal, mas, ao contrário,
é exercida por mais de 45 anos pela mulher de forma exclusiva, pelo
completo abandono do núcleo familiar e dos bens pelo esposo, deve ser reconhecida
a usucapião como defesa. Assim, rejeitou a pretensão do desertor de
partilhar o imóvel que nesses anos todos serviu à família e que sobrou da
família desfeita.
Tal raciocínio interpretativo, aliás, continuou o
relator, foi determinante para a promulgação da Lei n. 12.424/2011, a
qual, todavia, por questão de vigência temporal, não foi aplicada ao caso
em discussão, por definir que o cônjuge abandonado, após dois anos de
posse com fins de moradia, adquire a propriedade exclusiva do imóvel, em
detrimento do direito de propriedade do cônjuge que o abandonou.
O desembargador considerou, também o fato do
casamento ter ocorrido em 1955 e o marido ter deixado a casa há mais de 30
anos, conforme informação dada por ele mesmo no processo. A mulher, porém,
sustentou que o afastamento aconteceu em 1967 e que o ex-marido se
encontrou com os filhos raríssimas
vezes, como em 1974, em audiência de ação de
alimentos ajuizada por ela. Além disso, o homem desde a separação de fato,
não mais participou das despesas de conservação do imóvel e do
recolhimento dos respectivos impostos, o que reconheceu em seu depoimento
pessoal, circunstância que atuou em seu desfavor, eis haver evidenciado o
completo abandono do imóvel de sua parte.
Oportunizar, portanto, a partilha do imóvel, metade
por metade, pretendida pelo varão depois de 46 anos de posse exclusiva
exercida sobre o bem pela esposa abandonada - tão-só a partir do simples
fato de que a titularidade do terreno ainda se encontra registrada em nome
de ambos -, afora o sentimento de imoralidade e injustiça que a pretensão
exordial encerra em si própria, seria negar por completo os fundamentos
sobre os quais se construíram e evoluíram as instituições do Direito de
Família e do Direito das Coisas enquanto ciências jurídicas, finalizou
Torret Rocha. A decisão foi unânime.
Responsável: Ângelo Medeiros - Reg. Prof.:
SC00445(JP)
Fonte: JurisWay
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