É como se um paquiderme tentasse voar ou correr, mas seu peso o impedisse de avançar. Assim é o governo federal e sua gigantesca máquina administrativa. Nos últimos anos, com crescimento econômico fraco, o consumo dessa máquina é cada vez maior. Por conta disso, os manifestantes entoam nas ruas coros que cobram eficiência, e agora, até mesmo quem pega carona nessa estrutura jurássica, como os partidos aliados, já defende o corte na carne. Especialistas avaliam que a União gasta muito e mal e defendem uma reforma administrativa que reduza gastos, aumente a eficiência da gestão e enxugue o número de ministérios. Os números impressionam. A máquina administrativa do governo federal utiliza a mão de obra de 984.330 servidores para fazer seus 39 ministérios funcionar — o número era de 24, no final do governo Fernando Henrique Cardoso, e de 35 no último ano da gestão Lula. Hoje, o custo anual chega a R$ 192,8 bilhões só com o gasto de pessoal.
Somando o custeio de todas as pastas do Executivo — sem considerar investimentos — o valor é astronômico: R$ 611.053.640.813,00. Somente secretarias vinculadas diretamente à Presidência da República, são 14 — a mais recente, a da Micro e Pequena Empresa, foi criada para dar lugar ao aliado PSD, que nomeou o vice-governador de São Paulo, Guilherme Afif Domingos, um crítico contumaz do PT.
Na discussão emergencial que se seguiu depois que as manifestações mostraram força nas ruas, o governo fez várias sugestões, mas a maioria ainda é objeto de discussões. O PMDB, que ficou irritado por não ter sido consultado, embora tenha Michel Temer na vice-presidência, andou espalhando que uma das boas medidas que se poderia fazer era uma reforma administrativa, cortando, inclusive, nos ministérios do partido.
Especialistas em gestão pública ouvidos pelo GLOBO apontam quais seriam os gastos que a presidente poderia cortar para dar o exemplo aos outros entes da federação. Eles são unânimes ao afirmar que o governo gasta muito, e mal.
Professor da Escola de Economia e Finanças da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Fernando Holanda Barbosa afirmou que o governo federal deveria pensar nesta reforma administrativa em médio prazo, em até três anos, para poupar recursos que poderiam ser usados em outros setores.
— A reforma administrativa deveria cortar metade destes ministérios. Não faz sentido ter os vários ministérios que temos aqui. Ela começaria dando exemplo de que que estas pastas não deveriam ser usadas para a troca de apoios. Com a reforma, essas estruturas seriam voltadas para a sua finalidade, que é a de prestar um serviço a quem tem que prestar e não a de atender a políticos —sugeriu o professor.
Número de cargos é recorde
Enxugar a estrutura ministerial também foi uma medida apontada por Ruy Quintans, consultor e professor de Finanças, Economia e Gestão da Ibmec:
— Os Estados Unidos governam o mundo com cerca de 15 ministérios. A gente tem 39. Será que precisamos de tanto?
Ele argumenta a mudança deveria levar em conta também a folha de pagamento. Boletim Estatístico de Pessoal, elaborado pelo Ministério do Planejamento, mostra que o número de pessoas que tinham, em janeiro deste ano, cargo comissionado na administração direta, autarquias e fundações do Poder Executivo federal bateu recorde. Chegou a 22.417, o maior desde 1997, quando teve início a série histórica. No total, a União gastou R$ 204 bilhões no ano passado, com pessoal e encargos. Para Quintans, defende corte de gastos em outros itens:
— Deveria ser revisto o funcionamento da máquina pública, os benefícios pagos, os gastos com os carros oficiais, as viagens ao exterior, etc. Se você somar isso, são gastos que têm alguma representatividade.
Para Raul Velloso, especialista em contas públicas, o pacto não faz sentido, porque já existem mecanismos que obrigam os governos a se comprometer com a responsabilidade fiscal. Segundo ele, se o governo cumprisse o tripé da macroeconomia (ajuste fiscal, meta de inflação e câmbio flutuante), “o negócio já estaria bem”.
— Na realidade, não faz sentido colocar isso (a responsabilidade fiscal) em pacto porque isso não depende de um pacto entre entes da federação.O pacto de responsabilidade fiscal já havia sido de certa forma assinado quando a união renegociou as dívidas de estados e municípios e também com a edição da Lei de Responsabilidade Fiscal.
O professor Cláudio Salm, do Instituto de Economia da Universidade do Rio de Janeiro (UFRJ), interpreta o primeiro pacto proposto por Dilma como uma mensagem ao mercado:
— O primeiro ponto do pacto teve este elemento de acalmar os mercados de que o combate à inflação vai continuar e contém um recado de que os outros pontos não são uma permissão para gastar livremente.
Fonte: O Globo
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