O ministro Roberto Barroso, relator dos RExts 661.256 e 827.833, que discutem se aposentados que continuaram a trabalhar podem trocar sua aposentadoria por uma mais vantajosa, votou no sentido de que o instituto da "desaposentação é possível, porque não encontra vedação em lei". Após seu voto nesta quinta-feira, 9, o julgamento foi suspenso devido à ausência de alguns ministros.
Dando parcial provimento aos recursos, o ministro procurou construir um caminho do meio entre dois extremos:
a) simplesmente proibir a desaposentação; e
b) permiti-la, sem levar em conta o que já fora recebido pelo segurado.
Segundo ele, essa era a tendência do plenário, ou seja, "escolher um lado ou outro".
"Não tenho certeza que vá prevalecer o meu encaminhamento, mas sou convencido de que ele é o mais justo para o contribuinte e o mais equilibrado do ponto de vista atuarial", sustentou o ministro para a redação de Migalhas.
Premissas
Em fundamentado voto, o ministro Luís Roberto Barroso explica que partiu de cinco premissas para propor a nova forma de cálculo. São elas:
a) o Regime Geral da Previdência Social constitui um sistema baseado em duplo fundamento: contributivo e solidário;b) inexiste comutatividade estrita entre contribuição e benefício, em razão do caráter solidário do sistema. De outra parte, não é legítima a cobrança de contribuição sem oferta de qualquer benefício real, em razão do caráter contributivo do sistema;c) compromete o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema o incentivo a aposentadorias precoces. Sobretudo, viola o princípio da isonomia que aqueles que tenham passado à inatividade precocemente desfrutem de situação mais favorável do que aqueles que permaneceram mais tempo em atividade, sem se beneficiarem do sistema previdenciário;d) o art. 18, § 2º da lei 8.213/91 não contempla a situação de alguém que tenha se aposentado e, havendo voltado à atividade, deseje renunciar à primeira aposentadoria para obter uma nova. Vale dizer: existe uma lacuna na legislação.e) a lacuna é explicável porque, anteriormente, até o advento da lei 9.032/95, vigorava um sistema de pecúlio – com a devolução das contribuições efetuadas após a aposentadoria no momento em que o segurado passasse, em definitivo, à inatividade. Diante disso, a questão da desaposentação não se colocava.
Assim, Barroso sugeriu que a decisão que vier a ser proferida pelo STF passe a surtir efeitos apenas após 180 dias. O motivo é possibilitar que o Congresso tenha tempo para legislar sobre a questão. Caso não haja edição de norma, então começará a valer a decisão do Supremo.
Novo cálculo
Se o plenário acompanhar a proposta de Barroso, no cálculo de uma nova aposentadoria deverão ser considerados os fatores idade e expectativa de vida referentes ao momento em que a primeira aposentadoria foi estabelecida – quando o segurado passa a gerar custos à Previdência Social. Diferentemente, as variáveis tempo de contribuição e valor deverão considerar todo o período trabalhado, inclusive na volta ao mercado.
Calculado dessa forma "alternativa e mais barata", o aumento no valor da aposentadoria no caso de uma segunda aposentadoria, de acordo com o ministro, seria de 24,7%.
"Quem está se aposentando pela segunda vez não vai se aposentar em condições iguais àqueles que estão se aposentando pela primeira vez."
Solução suportável
Em seu extenso voto, o ministro Roberto Barroso explicou que a proposta seria uma "solução suportável", tanto para o segurado quanto para a administração pública, pois deve-se considerar "a realidade da seguridade social".
Para o ministro, "a vedação da desaposentação pura e simples produziria resultado incompatível com a Constituição". Isso porque, no seu entendimento, não pode o trabalhador que se aposenta e continua a trabalhar não receber nenhum benefício em troca, já que contribui igualmente a qualquer trabalhador.
Por outro lado, Barroso destacou que "não é possível de deixar de se levar em conta os proventos já recebidos", sob pena de comprometer o equilíbrio financeiro.
"Foram considerados e sopesados os conceitos de justiça comutativa e justiça distributiva, de equilíbrio financeiro e atuarial, assim como de justiça intergeracional. Quanto a esta última, é bem de ver que cada novo benefício criado hoje será suportado pela próxima geração, que não deve ter o seu futuro e sua seguridade inviabilizados. Por fim, a decisão aqui lançada, sem abdicar do papel próprio dos tribunais, que é a tutela de direitos, fez questão de abrir um diálogo institucional e respeitar a separação de Poderes. A solução aqui alvitrada decorre da interpretação sistemática e teleológica da Constituição e da legislação, mas é certamente inovadora, na medida em que supre uma lacuna referente ao tratamento jurídico da desaposentação." (grifos nossos)
Como consequência, a tese proposta pelo ministro Barroso e, que se acatada pelo plenário deverá ser firmada, com os efeitos inerentes ao instituto da repercussão geral, é a seguinte:
Tese: "Inexistem fundamentos legais válidos que impeçam a renúncia a uma aposentadoria concedida pelo RGPS para o fim de requerer um novo benefício, mais vantajoso, tendo em conta contribuições obrigatórias efetuadas em razão de atividade laboral realizada após o primeiro vínculo. A fim de preservar a uniformidade atuarial, relacionada à isonomia e à justiça entre gerações, essa possibilidade é condicionada à exigência de que sejam levados em conta os proventos já recebidos por parte do interessado. A despeito da falta de disciplina legal específica sobre o tema, é possível interpretar o sistema constitucional e legal vigente, para assentar a seguinte orientação geral: no cálculo dos novos proventos, os fatores idade e expectativa de vida devem ser aferidos com referência ao momento de aquisição da primeira aposentadoria. Com isso se impede que tais fatores tenham deturpada a sua finalidade de graduar os benefícios segundo o tempo estimado de sua fruição por parte do segurado."
Veja a íntegra do voto do ministro Barroso.
Fonte: Migalhas
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