A técnica da fundamentação per relationem, na qual o magistrado se utiliza de trechos de decisão anterior ou de parecer do Ministério Público como razões de decidir, não ofende o disposto no artigo 93, inciso IX, da Constituição. Contrariamente, a simples referência ao parecer significa fundamentação deficiente e torna nula a decisão.
Com este entendimento, a 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região acolheu preliminar de nulidade de agravo em execução interposto por Marcinho VP, que cumpre pena na Penitenciária de Catanduvas (PR). Ele se insurgiu contra o indeferimento, pelo juízo da execução, do pedido para realizar ‘‘atividades de escrita’’ com o objetivo de remir pena.
Segundo registrou o acórdão — porque o processo, na origem, tramita sob segredo de justiça —, a juíza federal Bianca Georgia Arenhart indeferiu o pedido nos seguintes e frugais termos, ipsi literis: ‘‘Atenta aos fundamentos ministeriais constantes do evento 70, indefiro o pedido elaborado pela Defesa no evento 65’’.
Preliminar de nulidade
Diante da ausência de fundamentação, a defesa de Marcinho VP solicitou, preliminarmente, a declaração de nulidade da decisão, por ausência de fundamentação, o que se constitui em flagrante ofensa ao contraditório e à ampla defesa.
No mérito, lembrou que o artigo 126 da Lei de Execução Penal, a partir da alteração da Lei 12.433, de 2011, garante ao condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto o direito de remição por trabalho ou por estudo.
Observou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a Recomendação 44, de 26 de novembro de 2013, que dispõe sobre atividades educacionais complementares para fins de remição da pena pelo estudo.
Para contextualizar o pedido de remição, a defesa citou a criação do projeto vanguardista ‘‘Escritores no cárcere: restauração pela escrita’’. A iniciativa foi lançada pela Corregedoria Geral da Justiça (CGJ), na unidade da Associação de Proteção e Assistência para Condenados (Apac) em Macau, no Rio Grande do Norte, e possibilita a remição de pena pela escrita.
Flagrante deficiência
A relatora do agravo em execução, desembargadora Claudia Cristina Cristofani, acolheu a preliminar de nulidade, deixando de se manifestar sobre os demais tópicos embutido no agravo, por restarem ‘‘prejudicados’’. Para ela, a fundamentação utilizada na decisão não se revelou suficiente para embasar a negativa do pedido. Sem esta motivação, o ato jurisdicional do julgador não é válido, acarretando a sua nulidade.
Conforme a relatora, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) aceita a chamada fundamentação per relationem ou por remissão, em que o julgador se vale das alegações de uma das partes para justificar suas razões de decidir. Entretanto, não se admite que estas razões se baseiem, exclusivamente, na remissão ao parecer do Ministério Público, sem mencionar, com argumentos próprios, as questões postas no recurso da parte apelante.
‘‘No caso dos autos, em que há simples referência ao evento em que está localizado o parecer ministerial, incorre em flagrante deficiência de fundamentação para embasar a decisão judicial, impondo-se, portanto, o reconhecimento da sua nulidade’’, registrou no voto, seguido pelos demais integrantes do colegiado.
Fonte: Conjur.
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