A decisão do desembargador José Carlos Paes, da 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, provocou um sentimento de impotência a Luciana Silva Tamburini. A agente licenciada do Detran-RJ, condenada em segunda instância a indenizar em R$ 5 mil o juiz João Carlos de Souza Correa, diz não se arrepender de ter dito ao magistrado — abordado durante uma blitz da Operação Lei Seca, no Leblon, Zona Sul do Rio — que “juiz não é Deus”.
O caso aconteceu em 2011, quando João Carlos de Souza Correa foi parado pela fiscal por dirigir um veículo sem placas e estar sem a Carteira Nacional de Habilitação. O magistrado chegou a dar voz de prisão a Luciana por desacato. Segundo a agente, a decisão que a condena por “ironizar uma autoridade pública” é uma ameaça ao trabalho de fiscais de trânsito e quaisquer outros agentes de segurança pública.
— A sensação que fica é o medo de trabalhar, porque se a gente faz o errado, está errado; se a gente faz o certo, também está errado. Quem trabalha com segurança pública ou com o público em geral não pode ter medo. É desmotivante. No primeiro tópico do acórdão, eles falam que eu abusei de autoridade, mesmo que o magistrado estivesse irregular, por ele ter uma posição na sociedade. Você tenta fazer um trabalho direito e está errado por causa disso — lamenta Luciana.
O processo, originalmente, foi movido pela agente contra o magistrado. Ela exigia indenização do juiz, alegando que ele tentou receber tratamento diferenciado por causa da função do cargo. Em primeira instância, no entanto, a Justiça entendeu que a policial perdeu a razão ao ironizar uma autoridade pública e reverteu a ação, condenando a agente a pagar a indenização. Luciana informa recorrer da manutenção da decisão, em segunda instância. O caso deve ir para o Superior Tribunal de Justiça.
— Eu vou até o final. Pode ter certeza que vou recorrer, porque sei que agi corretamente. Não me arrependo de nada, se tiver que fazer hoje de novo, farei a mesma coisa — afirma a agente.
Luciana, que está de licença do Detran-RJ para se preparar para um outro concurso, conta que atos de “carteirada” são recorrentes em operações desse tipo. Segundo ela, que trabalhou na Operação Lei Seca durante três anos, problemas com juízes e outras autoridades, no entanto, são incomuns.
— ‘Carteirada’ tem de todo tipo de gente, toda hora. É normal. Mas levar voz de prisão, ir à delegacia foi só dessa vez. Mas uma vez eu já apanhei. As pessoas acham que a gente está feliz de remover o carro dos outros. Eu estou ali pra cumprir a lei. Ele não foi o primeiro e nem o único juiz a ser parado. Normalmente, os juízes nem se identificam como juízes. A gente descobre pelo documento de identificação — relata a fiscal.
Com o salário de cerca de R$ 3,5 mil, Luciana considera a indenização muito alta. Na internet, a advogada Flávia Penido, de São Paulo, criou, nesta terça-feira, uma conta virtual de arrecadação para pagar a indenização de R$ 5 mil reais ao juiz. As doações já ultrapassaram o valor de R$, 3,4 mil. Todo o dinheiro arrecadado vai ser repassado a Luciana e à advogada dela, Sandra Tamburini.
— Achei a ideia bacana. É um incentivo, mas espero não precisar desse dinheiro e conseguir ganhar essa ação — comenta Luciana.
Juiz se recusa a comentar o caso
O EXTRA procurou contato com o juiz João Carlos de Souza Correa, que, por meio de assessoria de comunicação do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, informou que “não vai se manifestar”. O desembargador José Carlos Paes, que manteve a decisão em segunda instância, também informou que não vai comentar o caso.
Reincidente
João Carlos de Souza Correa já havia se envolvido em uma confusão, com um policial rodoviário, em 2009, quando foi parado em Rio Bonito. Além do excesso de velocidade, chamou a atenção dos agentes um giroflex azul (luz de emergência giratória, usada por carros da polícia, por exemplo) no teto. Assim como no caso da agente da Lei Seca, ele também deu voz de prisão ao policial que fez a abordagem.
Segundo o policial rodoviário Anderson Caldeira, que comentou o caso em 2011, logo que desceu do veículo, o magistrado, aos berros, disse que era juiz de direito:
— Ele relutou muito em se identificar e em nenhum momento parou de gritar e me ameaçar, dizendo que me colocaria na rua, que a minha carreira no serviço publico estava acabada etc.
Fonte: Portal Extra
Leia mais: http://extra.globo.com/noticias/rio/agente-condenada-por-dizer-que-juiz-nao-deus-nao-se-arrepende-faria-tudo-de-novo-14461827.html#ixzz3INqkVhrR
Concordo plenamente em gênero, número e grau com a atitude da agente, todavia, infelizmente, o que vemos na esfera jurídica é a proteção a classe magistrada. Não acredito que a agente fosse falar uma coisa dessas, sem motivo, nem razão, ou seja, ela deve ter sido provocada a falar "tamanha atrocidade"(risos). Fora que venhamos e convenhamos, o juiz por sua vez estava em sua "plena razão", pois, andar com veículo sem placa, até é desculpável (para isto que serve aquele documento provisório até o emplacamento, quando o carro for zero quilômetro), agora, dirigir sem habilitação, aí é um pouco demais. Pois, se "reles mortais" fizerem isto, o carro é apreendido na hora, fora a pontuação na carteira por infração GRAVÍSSIMA. E por que o "bonitão" pode? Se "todos somos iguais perante a lei" (art 5º, CF 88, caput), por que ele tem que ser diferente? A palavra "reincidente" pesa para todos, menos para os magistrados? Punidade para os civis e impunidade para os magistrados, é isto que veremos neste caso e até quando?
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