O Poder Judiciário brasileiro gastou R$ 104,6 milhões em pagamentos de auxílios a juízes, desembargadores e ministros em abril. O número aparece em levantamento feito pelo UOL nas folhas de pagamento de todos os tribunais do país durante o mês --o último com dados completos divulgados. A reportagem também buscou os dados para fazer o mesmo levantamento com os auxílios pagos a procuradores, mas os MPs (Ministérios Públicos) não divulgam essa informação detalhada.
Tanto os magistrados como os membros do MP querem um reajuste de 16% em seus vencimentos a partir de 2019. O aumento faz parte da discussão do orçamento no Congresso.
Somados os 12 meses de um ano, o valor dos auxílios pago aos magistrados chega a R$ 1,25 bilhão, valor similar ao orçamento inteiro da cidade de Palmas (capital do Tocantins) em 2018.
Em média, cada um dos 18 mil magistrados do país recebe R$ 5,8 mil de auxílios ao mês, ou seja, quase o triplo da renda média de um trabalhador brasileiro, que ficou em R$ 2.178 em 2017, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
As folhas de pagamento dos magistrados dos 93 tribunais do país estão disponíveis no site do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). O valor somado pelo UOL para chegar à cifra leva em consideração cinco tipos de auxílios: moradia, alimentação, saúde, pré-escolar e natalidade.
Moradia, o mais caro auxílio
Entre os auxílios pagos pelo Judiciário, o que mais custa aos cofres públicos é o de moradia. Em abril, o pagamento desse benefício somou a cifra de R$ 75 milhões. Esse auxílio beneficia mais de 70% dos magistrados brasileiros, que não precisam comprovar aluguel de casa para receber o valor mensal médio de R$ 4.377,73. A legalidade do benefício, entretanto, está em julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal).
Em seguida, vêm os gastos com o auxílio-alimentação, com R$ 18 milhões. Nesse caso, há variações entre a verba paga pelos tribunais, com valores que variam de R$ 884 a 1.925.
MPs omitem valores
No caso dos membros do Ministério Público, o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) divulga a lista de pagamento sem especificar os auxílios destinados aos promotores e procuradores. Há apenas um campo com valores de indenizações, que englobam todos os tipos de auxílio. Entretanto, poucos órgãos estaduais informam o valor e a maioria prefere omiti-lo, dando apenas o valor final das remunerações de seus membros.
No caso do MPF (Ministério Público Federal), as indenizações somaram R$ 7,29 milhões em abril --o que dá um valor médio de R$ 5.400 por procurador. No caso do MPT (Ministério Público do Trabalho), o valor de indenizações inclui valores a mais que os auxílios --o que impossibilita a soma. O mesmo vale para os MPs estaduais, já que muitos órgãos não informam os valores indenizatórios pagos.
Em nota encaminhada ao UOL, o CNMP informou que tramita uma proposta de resolução que estabelece que as unidades do MP "divulguem discriminadamente, nos respectivos portais da transparência, todas as verbas que compõem a remuneração de seus membros".
"As alterações sugeridas, entre as quais a informação sobre todas as verbas, como auxílio-alimentação, auxílio-transporte, auxílio-moradia e ajuda de custo, permitirão a discriminação dos valores recebidos. Ainda não há data de a proposição ser deliberada pelo plenário do CNMP", informa o órgão.
O CNMP não acrescentou nenhuma outra observação sobre o pagamento dos auxílios. O CNJ, que foi procurado nos últimos dias, não respondeu ao pedido do UOL sobre uma manifestação da entidade sobre o assunto.
"É uma imoralidade", afirma pesquisadora
Para Luciana Zaffalon, pesquisadora da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e coordenadora do IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), as remunerações pagas adicionalmente aos membros do Judiciário e do MP fazem com que eles superem --e muito-- o teto constitucional (hoje em R$ 33.733).
"Fiz a análise dessas carreiras em São Paulo para minha tese de doutorado, durante um ano, e vi que 97% dos membros do MP e do Judiciário receberam remunerações mensais acima do teto. Os benefícios corporativos representam cerca de 60% da remuneração de cada membro", diz. "Esses valores colocam magistrados e membros do MP entre os 0,08% mais ricos do país", completa.
Para a coordenadora do IBCCrim, o pagamento de auxílios sobre os quais sequer incide imposto de renda demonstra ainda mais a supervalorização da carreira no Brasil. "O auxílio é um valor adicional a um salário altíssimo, que entra direto em conta, sem que haja desconto. Ou seja, é uma imoralidade", afirma. Ela cita ainda que apenas 12% dos funcionários públicos recebiam acima de R$ 8.000, de acordo com dados do IBGE de 2015.
Segundo a pesquisadora, os valores pagos mensalmente a integrantes do Judiciário e do MP são bem maiores e fogem a comparações internacionais com magistrados e procuradores de outros países.
"Se comparado com Alemanha, Portugal, há uma discrepância insustentável. É é inevitável não ver o nível socioeconômico do nosso país. Mesmo com políticas de austeridade, quando o país passa por seu maior momento de arrocho, ele não alcança políticos e juízes. É difícil eles saírem desse arrocho como se não fizessem parte do problema", afirma a pesquisadora.
Fonte: Amo Direito
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