quinta-feira, 9 de maio de 2013

Projeto de lei quer legalizar ortotanásia


O anteprojeto do Código Penal, que está no Congresso Nacional para ser reformado, traz entre outros pontos a legalização da ortotanásia no Brasil. Diferente da eutanásia, que consiste na abreviação da vida de um doente incurável, a ortotanásia é a morte natural, sem interferência da ciência, permitindo ao paciente morte digna, sem sofrimento. Esta prática inclusive já é aceita pelo Conselho Federal de Medicina, por meio da Resolução 1.995/2012.

Apesar das práticas serem diferentes, o assunto continua provocando polêmica, já que para a maioria da população o Código Penal, se alterado, vai legalizar a eutanásia, que no Brasil é considerado crime de homicídio e quem o praticar está sujeito a pena que pode chegar a 20 anos de reclusão.

Para os médicos, porém, a polêmica é causada pela falta de informação das pessoas. “O que o anteprojeto prevê é a ortotanásia, que é deixar a morte vir na hora certa, quando se trata de doença incurável. Até que isso aconteça temos que aliviar o sofrimento, tirar a dor, até que ocorra naturalmente a falência múltipla dos órgãos. Isso não é crime desde que o diagnóstico seja feito corretamente e todos da família estejam cientes”, explica o médico intensivista Ronaldo Taques, que há 12 anos trabalho em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) e convive diariamente com esse drama.

Em casos de doença incurável, há pessoas que optam por retirar o paciente do hospital e levá-lo para casa, para morrer junto com os familiares. “Esses são casos de ortotanásia. É melhor levar essa pessoa para casa do que deixá-la em um leito de UTI, sozinha, afastada de todos, vendo o inaceitável acontecer. Acho mais digna essa atitude do que a falsa esperança”.       Nem todos, porém, estão preparados para tomar essa decisão. “A família normalmente não está preparada para a morte e nós temos que respeitar. Eu conforto a família, falo que não tem mais tratamento, mas em hipótese alguma desligo aparelhos, isso é eutanásia e eu sou contra a antecipação da morte, defendo que a morte deve vir no tempo certo”.

A presidente do Conselho Regional de Medicina, Dalva Alves das Neves, destaca que abreviar a vida foi e continua sendo proibido pelo Código de Ética Médica. “Somos favoráveis a ortotanásia, que é morrer no tempo certo e contra a distanásia, que é prolongar a vida quando não há mais o que fazer do ponto de vista médico”.

Ela cita como exemplo de distanásia a internação de Tancredo Neves, que foi mantido vivo apenas por aparelhos durante meses. “O Código de Ética Médica também não permite a distanásia”, explica a presidente do CRM, completando que do outro lado, como um caso clássico de ortotanásia, está à morte do papa João Paulo II. “Ele deixou escrito que não prolongassem sua vida fora do tempo certo”.       Mesmo a ortotanásia sendo aceita pelo CRM, o assunto ainda está longe de ser consenso e continua gerando polêmica. “Não sei a diferença exata entre eutanásia e ortotanásia, mas não concordo com nenhuma delas. Acho que só Deus tem direito de tirar a vida, só Deus sabe a hora certa de cada um. Além disso, temos que usar tudo o que a medicina tem de bom em favor desse doente”, defende a professora aposentada Maria Conceição Almeida.       A secretária Tereza Petroni, também é contra a abreviação da vida, não importa a terminologia usada. “Cada um tem seu tempo de vida, só Deus dá a vida e só ele pode tirar. Enquanto há vida, há esperança, por que acabar com ela?”.

Para o desembargador Paulo da Cunha, as mudanças no Código Penal – se aprovadas – não vão encerrar a discussão. “A polêmica vai permanecer, até mesmo porque os que são contra, vão continuar sendo contra. Dificilmente haverá convergência de pensamento, seja por questões éticas ou religiosas. O papel do judiciário é aplicar a lei e se esta lei for aprovada o judiciário não tem nada a fazer a não ser acolher o que for aprovado pelo Congresso. O magistrado, pessoalmente, pode até ser contra, mas não cabe a ele questionar a lei e sim aplicá-la”.

Quando se fala em eutanásia, ortotanásia ou distanásia é praticamente impossível não falar em religião, pois o assunto está ligado diretamente à vida, e assim como o aborto, a antecipação da morte não encontra apoio em nenhuma das crenças religiosas.

“O problema é que vivemos em uma sociedade extremamente materialista, que foca a produção, quando uma pessoa fica doente, em um leito de hospital, ela para de produzir e acaba se transformando em peso para a sociedade e muitas vezes para a família, por isso o tema eutanásia sempre vem à tona. O ser humano não pode ser descartado, a moral cristã prega a vida em todos os seus estágios”, defende o padre Deusdédit, pároco da Igreja do Coração Imaculado de Maria.

Para ele, só depois de esgotado todos os recursos da ciência, esgota-se a vida. “Além disso, já está provado cientificamente que o doente que tem fé tem mais chance de cura, por isso não podemos descartar a vida, milagres existem e acontecem”, destaca o padre, ressaltando que o sofrimento em um leito de hospital pode ser visto por uma outra ótica, “podemos ver o sofrimento como algo redentor, purificador, que serve para santificar não apenas o doente, mas os familiares também, é um momento de bênçãos”.       O religioso ainda ressalta que todo ser humano ter que ser olhado com dignidade, porque todo homem e toda mulher é feito a imagem e semelhança de Deus. “É preciso nascer com dignidade, viver com dignidade e morrer com dignidade”.

O diretor da Federação Espírita de Mato Grosso, Afro Steffanine II, afirma ser totalmente contra a interrupção da vida no corpo, “mesmo sabendo que as possibilidades de manter a vida no corpo sejam mínimas. Não se faz interrupção e não se tira a vida do corpo. A eutanásia é uma prática abominável e criminosa, vai contra a lei que rege o universo”.

Ele argumenta que a vida é um patrimônio de Deus e que somente ele tem o direito de determinar o segundo exato da partida de cada um da terra. “O homem não é dono da vida que alimenta o corpo, qualquer tentativa de tirar a vida do corpo constitui grave infração das leis divinas”.

Fonte: TJMT

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