O Pleno do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) aprovou uma resolução que pode restringir o acesso de advogados aos gabinetes de magistrados e secretarias de unidades judiciais. A proposta começou a ser discutida em fevereiro deste ano, mas foi suspensa com um pedido de análise da Comissão de Segurança do TJ-BA. Durante a sessão, o presidente do TJ, desembargador Gesivaldo Britto, afirmou que “não tem nada contra advogado”, mas sinalizou que precisa regulamentar a questão pela segurança dos magistrados e pelas situações de risco eles passam.
O pedido foi feito pela Associação dos Magistrados da Bahia (Amab) para “controlar o fluxo de pessoas” que circulam nas varas e relatado pela desembargadora Márcia Borges. De acordo com a corregedora-geral do TJ-BA, desembargadora Lisbete Teixeira, a Amab pediu uma reconsideração à recomendação editada em outubro de 2018, para que magistrados atendessem os advogados. “A Amab foi contra e queria que eu fizesse uma reconsideração, queria que os juízes saíssem do gabinete e fossem para o balcão atender advogado. Isso é impossível. Nem juiz vai atender em balcão e nem advogado vai falar em balcão sobre processo, na frente de todo mundo. É um processo que esteja em segredo de justiça, é da parte, seja lá qual for”, pontuou. Na época, a Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Bahia (OAB-BA) comemorou a edição do documento por preservar as prerrogativas da advocacia.
O texto aprovado, após longa discussão na manhã desta quarta-feira (24), estabelece que os advogados e as partes podem ter acesso aos gabinetes e secretarias “mediante prévia solicitação e anuência do magistrado”. A Comissão de Segurança emitiu um relatório atestando que a medida é necessária, pois os magistrados estão em situação de “vulnerabilidades”. Para a Comissão, o atendimento deveria ser efetuado nos balcões e secretarias judiciárias e administrativas, “devendo todos os servidores dispensarem toda atenção necessária, com urbanidade e diligência”. A redação proposta anteriormente pela relatora era: “O acesso das pessoas acima referidas aos gabinetes e secretarias, havendo necessidade, só será permitido mediante prévia solicitação e anuência do magistrado, podendo essa ser delegada”.
A corregedora-geral destacou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determina o atendimento de advogados por parte de juízes, além da própria Corregedoria do TJ, pois antes “havia juízes que não atendiam nenhum advogado”. Destacou que a recomendação que fez, que não chegou a ser uma portaria, foi distribuída de forma sigilosa para magistrados, mas vazou para a imprensa. “Eu estou voltando de correições no interior, os juízes estão atendendo os advogados e está tudo pacificado. Não está tendo problema nenhum. Os advogados estão sendo atendidos. Estão atendendo durante o dia conforme a disponibilidade do juiz”, declarou. Segundo o desembargador Pedro Guerra, oriundo do quinto constitucional da advocacia, a Lei Orgânica da Magistratura (Loman) determina o atendimento de advogados por entender que, assim, será atendido o jurisdicionado, que precisa do atendimento judicial. Para ele, a regulamentação pode dar problema e tudo não passa de uma questão de “bom-senso”. “Mas regulamentar bom-senso é muito difícil”. Lisbete falou que a recomendação que fez foi justamente baseada em “bom-senso”. “Nós estamos em um momento de paz com a advocacia toda e com todos os juízes”, reforçou. Nos debates, Pedro Guerra ainda sinalizou que uma resolução não poderia ferir uma lei federal, como o Estatuto da Advocacia. Ele se insurgiu contra o texto anterior, pois a palavra “só” restringia o atendimento. “Quem sabe da necessidade é o advogado”, declarou. Guerra ainda foi contra a expressão que permitia ao juiz delegar o atendimento para um servidor. “O advogado não quer falar com servidor, quer falar com juiz. Para que o delegar? Ele não quer falar com quem o juiz delegar para falar”, reforçou.
O desembargador Nilson Castelo Branco, que também se tornou desembargador através do quinto constitucional da advocacia, defendeu que o bom-senso é baseado nos “princípios da urbanidade e cortesia”. “Eu recebo a todos. Até a rapariga amiga do guarda noturno que é amigo do réu. Rapariga no sentido lusitano da palavra”, exemplificou. Castelo Branco também declarou que os problemas de atendimento não são sentidos na Justiça de 2º Grau, e sim no 1º Grau. Ainda avaliou que “é difícil introduzir normas jurídicas em regras de boa educação, de cortesia, em regras de urbanidade. Esse é o problema que existe”. Para ele, o anúncio prévio evitará também situações constrangedoras. “Eu posso estar saindo do toalete, em que estou me ajeitando e encontro uma bela advogada no meu gabinete”, sugeriu. O desembargador Sérgio Cafezeiro, também do quinto constitucional, sugeriu que a OAB pudesse se manifestar sobre a resolução. Gesivaldo negou o pedido e afirmou que a proposta é “uma regra interna do tribunal”. “Eu não vejo razões para OAB participar. A Amab que defende os interesses dos magistrados. E não estamos fazendo nenhuma regra contra advogados, estamos fazendo uma regra para magistrados”, falou. Lisbete ainda afirmou que, se o texto fosse aprovado como sugerido pela relatora, nenhum advogado mais seria atendido por magistrados, pois haveria delegação para os servidores. “E aí, vão começar nossos problemas. Eu não vou mais insistir”, reclamou. A relatora, após as ponderações, retirou a expressão “só” e “podendo ser delegada”.
O presidente da Comissão de Prerrogativas da OAB da Bahia, Adriano Batista, contou que após a recomendação da Corregedoria, a reclamação por não atendimento de juízes reduziu consideravelmente. “Lamento muito que o TJ-BA tenha dado este passo para trás. Desde o final do ano passado, as reclamações que dizem respeito ao não atendimento caíram absurdamente aqui em Salvador e no interior também, graças ao diálogo entre a OAB e a Corregedoria do Tribunal. Nesse momento, o TJ resolve colocar água na fervura? Estão de parabéns os magistrados que se recusam a atender e que agora terão um papel timbrado do TJ para colocar nas paredes, já intransponíveis dos seus ‘bunkers’, mostrando a todos que suas condutas estão respaldadas”, reclamou. Para Adriano, as reclamações voltarão a ser relatadas após aprovação da medida. Ainda destacou que, durante toda a sessão, “só se falou dos maus advogados”, não se falou dos “maus juízes”. “Essa resolução só vem para regulamentar a questão dos advogados e não regulamenta nada para os magistrados”, reforçou. Ainda disse que defende medidas de segurança, que são poucos casos de advogados que faltam com urbanidade, mas que isso não é motivo para se agendar atendimento. “Que tipo de agendamento é esse? Como o juiz vai atender? E os casos urgentes?”, questiona. Adriano considerou que o TJ, ao não acatar a proposta de Cafezeiro, para ser ouvida, agiu de forma corporativista. “Tem medo de ouvir o quê da OAB? Qual receio de ouvir a OAB?"
Fonte: Nação Jurídica
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