É indevido utilizar imagens de artista morto sem autorização da família e com objetivo de lucro, pois o ato viola direito de imagem post mortem. Assim entendeu a 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo ao determinar que o cantor Daniel indenize em R$ 100 mil a viúva e a filha de João Paulo, com quem formou dupla sertaneja, por ter exibido imagens do ex-parceiro em dois shows.
O colegiado concluiu que, em pelo menos duas oportunidades (uma delas registrada pelo Programa do Gugu), as imagens de João Paulo foram transmitidas em telão “para um grande número de pessoas” e “tiveram grande relevância para o sucesso do espetáculo, diante do apelo emocional a seus milhares de fãs”. Segundo o acórdão, proferido em novembro, essas exibições foram indevidas, o que torna obrigatório o dever de indenizar.
O valor deve ser atualizado e dividido entre a viúva e a filha do cantor sertanejo, que morreu num acidente de carro em 1997. O espólio do artista também afirmava que o ato se repetiu em “centenas” de shows, mas a 1ª Câmara entendeu que só as duas ocasiões foram comprovadas.
Apesar da condenação, os desembargadores afastaram a maioria dos argumentos apresentados. O espólio dizia que Daniel continua tendo proveito econômico com a imagem de João Paulo, inclusive em programas de TV. Também cobrava royalties da gravadora Warner Music pela venda de “discos, fitas, CDs, DVDs etc.” da antiga dupla e criticava a exposição de fotos e objetos pessoais em um museu particular organizado por um ex-empresário.
Memória coletiva
Para o relator do caso, desembargador Alcides Leopoldo e Silva Júnior, a exibição de imagens em programas televisivos é de responsabilidade das emissoras. Ainda assim, ele afirmou que tiveram caráter jornalístico e informativo, “diante do interesse público, em especial, por se cuidar da memória de pessoa pública, importando em verdadeira licença compulsória”.
“Na morte das pessoas públicas, principalmente quando decorrem de acidentes violentos ou são precedidas de angustiante doença e tratamento doloroso, comumente, amplamente divulgados pela mídia, eclode verdadeiro luto coletivo. As pessoas têm a sensação de serem próximas ao morto, e choram, lamentam e sofrem como se realmente fossem. Têm necessidade de notícias, revivem sentimentos solidários, deixam seus afazeres para acompanharem o velório”, afirmou o desembargador.
Ele também não viu problema na organização do chamado “Museu João Paulo & Daniel”, pois trata-se de um tributo ao artista, sem cobrança de ingresso para visitação, e está sediado num complexo turístico com piscinas, quadras e chalés — o local não é citado na decisão. Assim, a exposição não é motivo principal da existência do estabelecimento.
Sobre os royalties, disse que a cobrança de eventuais direitos relacionados à execução das obras do artista morto deve ser apresentada ao Ecad, escritório central encarregado da arrecadação e distribuição dos direitos relativos à execução pública de músicas.
Ainda cabe recurso. O cantor Daniel, por meio de sua assessoria de imprensa, declarou que o caso está sendo conduzido por seus advogados e afirmou ter confiança de que “a Justiça fará seu papel”. Ele afirmou ainda que “sua maior vontade é continuar expondo o amor que sente pelo parceiro de dupla João Paulo, quem considera um irmão, para que todos os fãs que os acompanhavam continuem a lembrar da sua imagem e obra”.
Clique aqui para ler o acórdão.
Processo: 0065782-09.2004.8.26.0100
Fonte: Conjur
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